O dia em que o Big Brother subiu ao relvado

Ficou conhecido como o Watergate do futebol. Faz precisamente esta quinta-feira, 23 de Setembro, 28 anos que um árbitro subiu pela primeira vez a um relvado com um microfone escondido debaixo da camisola. Chama-se José Roberto Wright e a ideia era mostrar ao Brasil a relação entre um árbitro e os jogadores dentro de campo.

A ideia era boa, o resultado foi trágico.

O jogo escolhido foi um escaldante Flamengo-Vasco: final de Taça, estádio cheio, 113 mil espectadores, craques como Zico, Júnior, Mozer e Roberto Dinamite. Craques que nunca perdoaram ter-lhes sido escondido que todas as conversas no relvado iam passar na Globo em horário nobre, no programa Espectacular.

«Aquilo não foi ousadia nenhuma, foi uma tentativa de provar ao público que aquela geração tinha má conduta», conta Mozer ao Maisfutebol. «Foi tudo premeditado para mostrar que os jogadores eram mal-educados e tratavam mal os árbitros. Por azar os jogadores foram quem se portou melhor naquele jogo.»

O árbitro contesta. «Fiz questão de não receber um centavo da Globo. Pensei dois dias para estar consciente do que ia fazer», diz também ao Maisfutebol. «Aceitei para mostrar ao público como é difícil o trabalho do árbitro num Flamengo-Vasco, serviria até de experiência para os jovens árbitros.»

A intenção podia até ser a melhor, mas resultou mal. Os jogadores não gostaram de ver a privacidade invadida, os clubes apresentaram queixa, o árbitro foi suspenso por 40 dias e mais tarde absolvido. «Foi transferido para São Paulo», diz Mozer. «Já não havia clima para ele continuar a apitar no Rio de Janeiro.»

Na altura a polémica criada foi tão grande que o central não esquece os pormenores da reportagem. Jogava no Flamengo, mas recorda que um adversário foi perseguido de forma particular. «Lembro-me que ele passou o tempo todo a provocar o Giovanni, a falar-lhe mal, o qual ficou tão surpreendido que nem reagiu.»

As imagens são claras nesse sentido: o médio do Vasco da Gama estava constantemente sob mira do
árbitro. «O Giovanni nem conseguiu levar aquilo para o lado mau». José Roberto Wright volta a contestar. «Não fui mal-educado, fiz uma carreira com mais de duzentos jogos e nunca fui incorrecto com nenhum jogador.»

Para além disso, o árbitro garante que não está arrependido do que fez. «Provocou uma revolução no futebol. Hoje tenho consciência que aquele trabalho foi uma das melhores reportagens jamais feitas no jornalismo desportivo. Os jovens ainda hoje acham o máximo quando vêem aquelas imagens», revela.

As imagens são, na verdade, curiosas: permitem espreitar para dentro do relvado como se lá estivéssemos. No fundo é o efeito Big Brother. Mozer diz apenas que é pena a autenticidade estar viciada. «Se repararem bem, praticamente só se ouve o árbitro falar. Houve uma teatralização para provocar reacções nos jogadores.

Wright é agora comentador do jornal Lance e lembra que foi absolvido no Supremo Tribunal Desportivo. «Estive em Mundiais e fui eleito o melhor árbitro sul-americano do século.» Mozer diz que tudo isso é verdade. «Foi um árbitro de elite, por isso percebo ainda menos por que fez aquilo», finaliza.

Veja as imagens e ouça tudo o que se passou no relvado:


Fonte: Mais Futebol

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