Opinião: A angústia do jornalista na hora de ser árbitro




O pior sítio para fazer de árbitro será num jogo que envolva uma equipa de árbitros. Assim como tentar pilotar um avião sem saber sequer andar de bicicleta. Mas foi o que aconteceu ao PÚBLICO, no jogo de futebol que encerrou a 3.ª Acção de Formação em Arbitragem para Jornalistas e opôs os profissionais da comunicação aos homens do apito. Sem lugar (ou habilidade) para alinhar na equipa dos jornalistas, o autor destas linhas viu-se inesperadamente atirado para o papel de juiz da partida.
Foi o culminar de um dia preenchido por sessões teóricas e práticas que teve como objectivo dar a conhecer o mundo dos árbitros, a forma como se preparam e as dificuldades inerentes à função. Começou com a análise de vídeos (saldo: oito decisões correctas em 15, mesmo com várias repetições de ângulos diferentes) e continuou com palestras sobre o treino físico dos árbitros (que está na vanguarda em termos europeus), o papel dos observadores e o testemunho pessoal de Artur Soares Dias sobre a preparação para uma partida. E se o árbitro do Porto confessou abordar os jogos com uma atitude que é um misto de "quase indiferença" com uma postura de "peito aberto", após a nossa experiência de campo, que teve lugar num relvado secundário do Complexo Desportivo da Mealhada, temos de lhe admirar a frieza.

É inacreditável a quantidade de coisas a acontecer ao mesmo tempo. É necessário estar atento à bola, ao jogador que a joga, aos que a disputam e às indicações do árbitro assistente. Tomar decisões numa fracção de segundo e lidar com os protestos (e aqui os árbitros não ajudaram, como que para fazer sentir ao jornalista o que eles passam semanalmente). Confessamos que nem sabemos como ficou a partida. E tudo isto num campo sem público. Imagine-se uma final num grande estádio, com as bancadas junto ao relvado e o ruído de milhares de adeptos.

Escreveu o uruguaio Eduardo Galeano que o trabalho do árbitro "consiste em fazer-se odiar. Única unanimidade do futebol: todos o odeiam. Sempre assobiado, nunca aplaudido". "Bode expiatório de todos os erros, explicação de todas as desgraças", acrescenta o autor de Futebol, Sol e Sombra.

Eles correm tanto ou mais que os jogadores, tomam centenas de decisões em 90 minutos, vigiam uma área de um hectare onde 22 homens não hesitam em recorrer à farsa. É fácil criticá-los no conforto do sofá e com a vantagem das repetições televisivas. Da próxima vez, imagine-se no lugar dele.



Por Tiago Pimentel (Jornalista do jornal PÚBLICO)

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